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A Xbox ganhou um grande poder, faltou a responsabilidade

Phil Spencer Thanos

"Com um grande poder, vem uma grande responsabilidade."

Toda a gente conhece esta frase... vem do Spider-Man. Acho que se aplica na perfeição à situação da Microsoft / Xbox que estamos a viver esta semana.

Apesar de estar em terceiro lugar na corrida de fabricantes de consolas, a Xbox sempre foi uma marca com potencial tremendo por ter a Microsoft por detrás. Para contexto: a Microsoft é neste momento a companhia mais valiosa do mundo.

Desde de 2021, com a aquisição de $7.5 mil milhões da Bethesda, e mais recentemente da Activision Blizzard por $69 mil milhões, que a Xbox tem usado o grande poder aquisitivo da Microsoft para potenciar a marca e alimentar a sua aposta para o futuro: o Xbox Game Pass.

O Xbox Game Pass é um serviço de subscrição disruptivo comparativamente ao modelo tradicional de videojogos em que precisas de pagar 79,99 euros para jogar um título acabado de lançar. No Xbox Game Pass os jogos first-party da Xbox e, às vezes jogos negociados com outras editoras, estão disponíveis para jogar no dia de lançamento sem custos adicionais.

Para os jogadores, é um excelente negócio em que por uma fracção do preço de um jogo novo tens acesso a uma biblioteca com centenas de jogos. O modelo do Xbox Game Pass foi concebido para atrair centenas de milhões de subscritores, mas apesar do grande sucesso inicial, tem tido dificuldade para sair da casa dos 30 milhões de subscritores (os números mais recentes dizem que tem 34 milhões de subscritores).

Xbox Game Pass Diablo IV

Na sua corrida para aumentar o apelo do Xbox Game Pass, a Xbox começou a engolir editoras inteiras para aumentar rapidamente o catálogo do serviço. Desta forma, jogos altamente antecipados da Bethesda, como Starfield e Redfall, foram cabeças de cartaz quando estrearam ao serviço. Depois do frenesim de compras, parece que a realidade assentou: o Xbox Game Pass não está a atrair a receita que a Microsoft esperava, comparativamente ao que a marca está a gastar.

De acordo com uma entrevista com Phil Spencer conduzida pelo Windows Central, a Xbox gasta mais de $1000 milhões por ano só para garantir a estreia de jogos third-party no Game Pass. Neste valor não está incluído os custos de produção dos jogos first-party, que também estreiam no dia de lançamento no serviço.

A Xbox é a maior editora de videojogos

Com a aquisição da Bethesda, Activision Blizzard e vários outros estúdios como a Double Fine, Ninja Theory, Playground Games, etc, a Xbox tornou-se na maior editora de sempre na indústria dos videojogos.

A Xbox maneja efectivamente uma espécie de Infinity Gauntlet no que toca a videojogos e albergue de uma quantidade extraordinária de talento. Esta semana, a gestão da Xbox provou que, apesar de ter ganho este poder, não tem a responsabilidade para geri-lo.

Não podia haver pior demonstração do que encerrar quatro estúdios de uma vez. Pior ainda, que um estúdio como a Tango Gameworks, que tinha lançado recentemente Hi-Fi Rush, descrito pela própria Xbox como um sucesso em todos os aspectos, possa ser encerrado da noite para o dia sem uma explicação razoável.

No e-mail de Matt Booty, líder dos Xbox Game Studios, em que foi anunciado o encerramento dos estúdios foi dito que “estas mudanças estão cimentadas em dar prioridade a títulos de grande impacto e a mais investimento no catálogo de jogos blockbuster da Bethesda”. Então, a prioridade agora são jogos AAA, certo?

No dia seguinte, numa reunião online com os funcionários da ZeniMax para explicar as decisões, Matt Booty diz que precisam de jogos mais pequenos que tragam prestígio e prémios à marca. O que Booty acabou descrever é precisamente Hi-Fi Rush, um jogo de orçamento mais pequeno que trouxe prémios e prestígio à marca.

Hi-Fi Rush 3 milhões de jogadores

A comunicação confusa e inconsequente da Xbox é um sinal da má gestão que atormenta a marca há anos. Todas as marcas cometem erros. Ainda esta semana, a Sony teve uma crise com a versão PC de Helldivers, à qual acabou por responder de forma decente (graças à grande pressão da comunidade, diga-se). A Nintendo pode ter uma postura difícil de entender e demasiado tradicional em algumas situações. Mas a Xbox tem feito coisas auto-destrutivas das quais passa anos a tentar recuperar (como a infame apresentação da Xbox One em que passou mais tempo a falar de TV e DRM do que de jogos).

Esta semana, a reputação da Xbox passou a zero. Não são apenas os fãs de videojogos que estão incrédulos e revoltados – há criadores de conteúdo que dizem ter perdido a vontade de jogar coisas da Xbox, enquanto outras pessoas dizem que querem vender a sua Xbox – os produtores de videojogos, inclusive produtores que estão debaixo da Xbox / Microsoft, têm proferido críticas à gestão nefasta da marca e pela falta de apoio aos criadores em épocas difíceis como a que estamos a viver.

Será que a Xbox vai conseguir recuperar a confiança da indústria?

Nunca digas nunca. Enquanto marca, acredito que a Xbox continua a ter potencial. O Xbox Game Pass é uma proposta apelativa, apesar do modelo de negócio precisar de ajustes para ser economicamente viável. A aposta no cloud gaming também pode dar frutos no futuro. E para todos os efeitos, a Xbox permanece a maior editora de videojogos com um vasto catálogo de propriedades. Se para alguns isto era motivo de entusiasmo anteriormente, agora existe um medo generalizado que se transforme numa história de terror.

Diz-se que nos negócios, o dinheiro fala sempre mais alto. Os videojogos são uma fonte de entretenimento e diversão, mas ultimamente, são um negócio para as muitas companhias que constituem a indústria. Dito isto, é difícil ter diversão e entretenimento quando sabemos que estúdios talentosos como a Tango e Arkane Austin foram encerrados com um estalar de dedos. Acho que o segredo está em manter um equilíbrio e gestão responsável, algo que a Nintendo, por exemplo, tem provado saber fazer muito bem. A Wii U foi um tremendo falhanço comercial, mas a Nintendo manteve uma impostura impecável com os criadores de jogos.

A decisão da Microsoft destruiu a imagem de Bons Rapazes cultivada por Phil Spencer e companhia ao longo dos últimos anos. E se os negócios são tão importantes para a Microsoft, parece ter-se esquecido que a reputação é crucial para manter boas relações. Neste momento, a reputação da Xbox está em mínimos históricos em que até os fãs mais ferrenhos e defensores da marca perderam a esperança e confiança na capacidade da Microsoft para se posicionar na indústria dos videojogos.

Autor

Jorge Loureiro
Fundador da GeekinOut

O Jorge acompanha ferverosamente a indústria dos videojogos há mais de 14 anos. Odeia que lhe perguntem qual é o seu jogo favorito, porque tem vários e não consegue escolher. Quando não está a jogar ou a escrever sobre videojogos, está provavelmente no ginásio a treinar o seu corpo para ficar mais forte do que o Son Goku.